Centenário da Pantera Negra
- Na Rede
- 3 de dez. de 2018
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Por: Juan Madeira

Na Vila Belmiro, diante de mais de 21 mil pessoas, Sócrates recebe uma bola por cima do goleiro Wilson; aproveita a oportunidade e, de calcanhar, empata o jogo para o Botafogo-SP, aos 44 minutos do primeiro tempo. O jogo permaneceu 2 a 2 até João Carlos Motoca virar o placar a favor da equipe de Ribeirão Preto, contra o Santos, no Campeonato Paulista de 77. O clube paulista que tem como mascote uma Pantera Negra, contou com uma série de jogadores de renome em sua história. Nas décadas de 60 e 70, contava com nomes como: Sócrates, Baldocchi e Zé Mário. “No momento o melhor time era o nosso. Tínhamos jogadores como Sócrates e Zé Mário, sem contar Aguilera, Lorico. Era um time grande. Nós sabíamos que o título chegaria, não tinha dúvida”. Relembra à “TV Botafogo” João Sebinho, massagista do tricolor em 77. Naquele ano, o Botafogo conquistou o Troféu Cidade de São Paulo, primeiro turno do estadual; na época “muito mais valorizado do que hoje”, como afirma Amir Abdala, torcedor fiel do time, que acompanhou, com apenas oito anos de idade, o empate contra o São Paulo, garantindo ao Botafogo, por ter tido melhor campanha, o título do primeiro turno do estadual daquele ano.
Criado em 1918, a partir da junção de três clubes do bairro Vila Tibério: Ideal Futebol Clube, União Paulistano e Tiberense, o Botafogo Futebol Clube iniciou sua centenária história no dia 12 de outubro. Mesma data em que disputou sua primeira partida contra um clube já extinto, da cidade de Franca, denominado Esporte Clube Coronel Fulgêncio de Almeida. O Pantera iniciou sua trajetória derrotando o clube francano por 1 a 0. Na década de 20, o tricolor conquistou alguns títulos e seguiu crescendo no futebol do interior. A rivalidade que se construiu contra o Comercial, conhecido como Leão do Norte, outro clube centenário de Ribeirão Preto, começou em agosto de 1920, no Estádio da Rua Tibiriçá, que pertencia ao Leão. O resultado da peleja foi uma goleada de 8 a 0 para o Comercial, de acordo com o livro “Come-fogo: tradição e rivalidade no interior do Brasil”, do jornalista Igor Ramos. Em 1927, o Botafogo conquistou seu primeiro título oficial: o Campeonato Paulista do Interior. Naquele ano, a competição interiorana teve duas edições por associações de futebol distintas. Pela Associação Paulista de Esportes Atléticos, uma extinta entidade de futebol, o Botafogo venceu o Francana na final e sagrou-se campeão do interior de São Paulo. O craque do título de 27 foi Máximo Tarujillo, ou simplesmente Carrapato. O zagueiro é considerado, pelos tricolores, o primeiro ídolo do time. A disputa contou com 12 equipes, incluindo o Operário, time rival do Botafogo. O clássico “Come-Fogo”, é considerado pelos jornalistas como um dos maiores clássicos regionais. Já pela Liga de Amadores de Foot-Ball, também extinta, a Ponte Preta foi campeã, em um certame que contou com apenas 3 clubes, Rio Claro Futebol Clube, XV de Piracicaba e a própria Ponte Preta.
Depois de 29 anos em seca de títulos oficiais, o Pantera conquistou dois regionais. No ano de 1956, venceu a série A2 do Campeonato Paulista, que equivale a segunda divisão da disputa. A Taça dos Invictos foi o outro título conquistado pelo clube naquele ano. No primeiro, 32 equipes foram divididas em 4 grupos do 8 times cada. Classificaram-se para o chamado Torneio dos Finalistas os 2 primeiros colocados de cada grupo, totalizando 8 times, divididos em 2 grupos. Na segunda fase, os vencedores dos grupos A e B disputaram a final, por pontos em turno e returno. O Botafogo foi o melhor do Grupo A, com 9 pontos. O Paulista, da cidade de Jundiaí, foi o mais bem colocado do Grupo B, somando um total de 7 pontos. Nas partidas finais, o Pantera venceu o primeiro jogo por 1 a 0. O segundo foi vencido pelo Paulista, pelo placar de 3 a 1. O jogo decisivo terminou 1 a 0 para o Botafogo. A segunda premiação, denominada Taça dos Invictos é um troféu entregue aos clubes de São Paulo, da capital e também do interior do Estado, que permanecem invictos por uma determinada quantidade de jogos, contabilizadas unicamente em partidas disputadas pelo Campeonato Paulista. Na ocasião, o Botafogo permaneceu um número de 19 partidas invicto. No ano de 1957, o Pantera conquistou o Torneio Início Paulista, que era disputado em apenas um dia. As partidas duravam somente 20 minutos, 10 em cada tempo. Somente a final era maior: 60 minutos no total. O Torneio foi realizado de 1919 a 1958, com mais cinco edições diferentes em 1969, 1984, 1986, 1991 e 1996. O ídolo do time nas conquistas da década de 50 foi o goleiro - que mais utilizou a camisa tricolor - Galdino Machado. Chegando ao clube em 1954, atuou pelo Botafogo, entre partidas oficiais e não oficiais, 252 vezes. Com 103 vitórias, 56 empates e 93 derrotas. Além desses títulos, o clube - também no ano de 1956 - foi o campeão do Centenário de Ribeirão Preto, torneio municipal, vencendo o Comercial na final, por 4 a 2.
Na década de 60, o Pantera conquistou 3 títulos internacionais, um estadual e outro interestadual. A primeira conquista internacional do Botafogo aconteceu na Argentina, em 1962. Em um período que passou no país vizinho, o tricolor venceu o seu primeiro Torneio Internacional da Argentina. Em um total de 14 partidas neste campeonato, que aconteceu ao longo de 41 dias, o tricolor venceu 9, empatou 3 e perdeu apenas 2 partidas. O artilheiro do clube paulista foi Silva, e o goleiro menos vazado foi Galdino Machado. No ano de 1969, o Botafogo conquistou seu segundo título internacional, o mesmo de 62, na Argentina. O terceiro título internacional tricolor veio na Guatemala em 1966, quando conquistou o Pentagonal da Guatemala. Em 1967, o Pantera conquistou um título interestadual: a Copa Ribeirão Preto, onde 7 clubes de 5 cidades diferentes, entre três estados brasileiros no total, disputaram o torneio amistoso. Os clubes que disputaram o campeonato foram: Botafogo-SP, Comercial, Ferroviária, Corinthians, Fluminense, Botafogo-RJ e Náutico. O certame foi disputado no sistema quandrangular por pontos corridos. Na ocasião, havia um único critério de desempate, os pontos marcados. Por isso, após o término do torneio, e com o empate em pontos entre Comercial, Botafogo e Ferroviária, o título foi dividido. O primeiro turno do Paulista de 60 ficou com o Botafogo, em um ano que o Santos de Pelé conquistou o título estadual.
A década áurea do tricolor foi a de 1970. Zé Mario, Manoel e Sócrates são alguns dos jogadores que compuseram o elenco e deram ao Botafogo anos de alegria e conquistas. Na década da vitória dos títulos de: Torneio Internacional da Argentina em 71 e 72, Sesquicentenário da Argentina em 72, Taça Ribeirão Preto em 74; Torneio Vicente Feola de 76; e a Taça Cidade de São Paulo em 77; o Botafogo contava com jogadores que atuariam pela Seleção Brasileira. Nas palavras do fanático torcedor tricolor Amir Abdala, Sócrates foi o melhor jogador da história do clube. “Eu pude assistir ao principal jogador da história do Clube: Sócrates. Quando criança pude acompanhá-lo jogando com a camisa do Botafogo”. Ainda que nascido em Belém, foi no Botafogo de Ribeirão Preto que o ex-meia da Seleção Brasileira iniciou sua carreira. Sócrates começou no Bota em 1974 e atuou pela equipe principal ao lado do atacante Zé Mário e Geraldão. Depois do ano de 1977, em que passou jogando no Pantera, o “doutor”, que conciliava treinos com a faculdade de medicina, transferiu-se para o Corinthians. Chegando na capital, fez a diferença nas finais dos paulistas de 82 e 83, derrotando o São Paulo, no estádio do Morumbi. Pela seleção brasileira, disputou dois mundiais (1982 e 1986), sendo 63 jogos (41 vitórias, 17 empates, 5 derrotas) e 24 gols marcados. Antes de encerrar a carreira, teve passagem pela Fiorentina, da Itália, Flamengo e Santos. O doutor faleceu em 2011 com 57 anos de idade, em decorrência de um choque séptico, causado por problemas que o atleta teve com o alcoolismo. No dia em que faleceu, o Corinthians sagrou-se pentacampeão brasileiro de futebol. Antes da partida começar, jogadores e comissão técnica do Corinthians homenageiam Sócrates, repetindo o gestual que ele utilizava nas comemorações de seus gols.

Outro dos principais jogadores da história do Botafogo é José Mário Donizetti Baroni, conhecido como Zé Mário, nascido em Ribeirão Preto. Atuava como ponta-direita. Defendeu as cores do seu clube de coração, o Botafogo-SP, e foi o primeiro jogador de clubes do interior a jogar pela Seleção Brasileira de futebol. Fez parte do elenco botafoguense que conquistou a Taça Cidade de São Paulo em 1977. Morreu precocemente, aos 21 anos de idade, vítima de leucemia. Zé Mário jogou ao lado de Sócrates, Geraldão, João Carlos Motoca e Lorico. Foi considerado por muitos jornalistas esportivos a revelação do ano de 1977. Justamente num momento de alegria, não só para o jogador, mas para toda a coletividade botafoguense, o médico da Seleção Brasileira Lídio Toledo, em exames de rotina, descobriu a grave doença do jogador. O atacante defendeu o Brasil em duas oportunidades. Contra a Inglaterra e Seleção Paulista, ambos no Maracanã, logo após precisou ser afastado para tratamento, porém o atleta não resistiu e faleceu ainda jovem.
Nas décadas de 80, o Botafogo conquistou 3 títulos internacionais. Foram eles: Liga Desportiva da Argentina; Torneio Carmencita Granados; e Copa Damián Castillo Durán. Raí, irmão do doutor Sócrates foi um atleta de destaque revelado pelo Botafogo. Iniciou a carreira no tricolor com apenas 15 anos. Foi emprestado para a Ponte Preta, no Campeonato Brasileiro de 1986, antes de despertar o interesse do São Paulo, no ano seguinte. Além de ser campeão Brasileiro, o São Paulo de Raí conquistou a Libertadores de 1992 e 93 e o Mundial Interclubes de 92. O meia atuou pelo Paris Saint-Germain. Nos anos 90 o Pantera teve triunfos importantes para a história e o segmento da evolução do time. Para aquele torcedor fiel, representado por Amir, o acesso para a Série A em 1998 - com o vice campeonato da Série B - foi emocionante e comovente por diferentes motivos, para Abdala, por uma questão pessoal. “No dia que o Botafogo iria fazer o jogo decisivo em Ribeirão Preto, meu irmão havia falecido, ele estava doente. Me lembro que o jogo seria a tarde, e depois do velório nós fomos para casa da minha cunhada. Quanto deu o horário do jogo, liguei a televisão, mas deixei sem som, só para acompanhar. E no momento em que eu liguei a televisão, estava havendo um minuto de silêncio, uma homenagem ao meu irmão. O acesso foi muito marcante, nesse sentido pessoal”. No espaço de 3 anos, começando como vice campeão Brasileiro da Série C em 1996, o Botafogo conseguiu o acesso para a Primeira Divisão do campeonato. Antes disso, em 1995, ainda houve o acesso do clube para a Série A1 do Campeonato Paulista.
Nas temporadas recentes, de 2000 até o ano do centenário, o tricolor enfrentou algumas dificuldades, no entanto, se encaminha para retornar a figurar entre os grandes do interior. Em 2018, conseguiu o acesso para a Série B do Brasileirão. Alguns anos atrás, em 2000, venceu a Série A2 do Paulista, em 2006, conquistou a Série A3 do campeonato estadual. Em 2010, venceu o Paulista do Interior. Somado às comemorações e aos festejos do centenário, o Pantera selou o ano de 2018 com a consagração para a Série B do campeonato nacional de futebol.

Com a ajuda dos jogadores Marcos, do meio campo Serginho, do atacante Caio Dantas, que relembra a importância do acesso deste ano. “No começo a gente fica meio sem acreditar no feito que nós conquistamos. No primeiro momento parecia que era só mais um jogo (quarta de final contra o Botafogo-PR), emocionante, claro, em que eu pude fazer o gol no final e a que gente ganhou. Mas depois a gente vai vendo a proporção do que é isso, do que a torcida do Botafogo é. Foi para selar o que eu vinha fazendo desde o começo quando entrei no Botafogo e fui com a cabeça muito focada para dar meu melhor e entrar para história do clube. Graças a Deus eu pude fazer isso, dar esse acesso importante para a torcida e para o clube do Botafogo”.
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